OXUM

A BELA E VAIDOSA

Sincretizada com diversas Nossas Senhoras ao longo do País, Oxum manifesta uma delicadeza e juventude semelhantes á figura tradicional da mãe de Jesus. Responsável pela fertilidade e pelos recém-nascidos é sobretudo conhecida por sua beleza, a qual as lendas adornam com ricas vestes e objetos de uso pessoal. Dominam os rios e cachoeiras, imagens cristalinas de sua influência: atrás de uma superfície aparentemente calma podem existir fortes correntes e cavernas profundas.

“Aiieieô, aiieieô Mamãe Oxum” é um pequeno trecho do refrão do samba-enredo da escola de samba Império Serrano, do Rio de Janeiro. Sem dúvida, Oxum é um orixá feminino bastante conhecido e cultuado no Brasil, onde sua imagem é quase sempre associada á maternidade, sendo comum ser invocado através de carinhosa expressão Mamãe Oxum.

Oxum é o nome de um rio em Oxogbo, província de Ibadã, na Nigéria. É também a morada da deusa que lhe da o nome, sendo ela conhecida como a dona da água doce. Portanto, seu elemento e habitat natural são o leito dos rios e, especialmente, as cachoeiras, onde costumam serem-lhe entregues as comidas e os presentes.

Tem a seu cargo o dom da fertilidade, assim com Yemanjá. É a ela que se dirigem as mulheres que querem engravidar, sendo responsabilidade de Oxum também zelar pelas crianças que estão em gestação e pelas recém-nascidas, até que possam falar.

Apesar dessa forte marca de maternidade, Oxum é geralmente apresentado como deusa-moça, bastante jovem. Foi rainha de Oyó, como segunda esposa de Xangô – sua preferida pela jovialidade e beleza.

Além dessas ligações, Oxum também é considerado a deusa da beleza – e, por algumas extensões não totalmente aprovadas pelo candomblé tradicional, também a deusa das artes e de tudo onde a estética é importante, já que seria uma figura bela e que gostaria de estar rodeada por tudo que é bonito e vistoso. Por outro lado, é também a deusa do dinheiro, da riqueza, sendo atribuído a ela um gosto refinado.

Popularmente, no Brasil, costuma associar Oxum ao ouro, o que é reforçado pelo amarelo-ouro de suas roupas nas cerimônias e nos colares dos filhos de santo: afinal, é o metal mais valioso que conhecemos. Segundo a tradição ioruba, seu metal é o cobre, mas a correlação com o ouro não esta errada: de acordo com os historiadores, o cobre era o metal mais caro conhecido naquela nação.

Pela sua beleza, Oxum teria despertado muitos amores. Mais seu relacionamento mais importante foi com Xangô (há uma lenda a respeito de coo ambos se conheceram no artigo referente a Exu). Seu relacionamento coma figura de Exu também é satisfatório, já que ele a teria ajudado tanto em relação a  primeira violência de Xangô, a tentativa de violentação, como a uma segunda. Conta uma estória que Xangô, querendo exercer total controle sobre Oxum, prendeu-a na torre de seu castelo. Exu, passando por ali, ouviu Oxum chorando e se interessou em saber a razão de tal sofrimento. Foi Exu, portanto, que levou o pedido de socorro a Orumilá (o deus supremo), o qual soprou um pó sobre Oxum, transformando-a em pomba e possibilitando com isso que ela voasse e consequentemente fugisse. É por essa lenda que a pomba é um animal sagrado para os seguidores de Oxum.

São atribuídos a Oxum certos poderes de feiticeira, ou, pelo menos, de fácil acesso a eles. Assim, seu poder sobre a maternidade seria resultado de uma feitiçaria, Pierre Verger recolheu a seguinte lenda a esse respeito:

“Quando todos os orixás chegaram a terra, organizaram reuniões onde as mulheres não eram admitidas, Oxum ficou aborrecida por ser posta de lado e não poder participar de todas as deliberações. Para se vingar, tornou as mulheres estéreis e impediu que as atividades desenvolvidas pelos deuses chegassem a resultados favoráveis. Desesperados, os orixás dirigiram-se a Olodumaré (Olorum) e explicaram-lhe que as coisas iam mal sobre a terra, apesar das decisões que tomavam em suas assembleias. Olodumaré perguntou se Oxum participava das reuniões e os orixás responderam que não. Olodumaré explicou-lhes então que, sem a presença de Oxum e do seu poder sobre a fecundidade, nenhum de seus empreendimentos poderia dar certo. De volta a terra, os orixás convidaram Oxum para participar de seus trabalhos, o que ela acabou por aceitar depois de muito lhe rogarem. Em seguida, as mulheres tornaram-se fecundas e todos os projetos obtiveram felizes resultados”.

Esta narrativa pode surpreender a quem sempre identificou Oxum como uma figura que poderia representar o objeto sexual dos orixás, já que sempre é lembrada por sua beleza, sua ligação coma maternidade e sua docilidade.

Na verdade, este é um engano que a própria natureza de Oxum gostaria de provocar. Afinal, são muitas as particularidades no culto de remetem a essa ideia. No peji (altar) de Oxum, alem das quartinhas, pratos, vasilhas com água e comida comum a todos os orixás, costuma ver flores, perfumes e até bonecas. Entre seus símbolos, existe uma espada, como é comum a praticamente todos os orixás, mas a também o abelé, uma espécie de leque de latão. Uma miniatura de seu abelé fica junto ao seu altar (no seu caso, uma pedra vinda do fundo de um rio ou de uma cachoeira, um seixo rolado e desgastado pela água) dentro de uma terrina de louça branca, mergulhada no mel.

Sua dança também insiste nessa imagem de vaidade, pois, ao dançarem, seus iaôs imitam gestos de uma bela mulher que, delicada com o que faz, esta tomando banho em um rio, penteando-se com um pequeno espelho, sempre com gestos graciosos, abanando-se com prazer, agitando os braços coreograficamente para fazer seus inúmeros braceletes tilintarem.

De fato, as características de requinte, de certa exibição, de gosto pelo o que é caro, luxuoso e bonito são muito fortes em Oxum. Sua função de mãe também é valorizada. Mas nada disso a faz uma mulher meramente passiva. Muito astuta, é competitiva e esta sempre alerta,mas gosta de confundir seus inimigos,aproveitando-se da imagem de desprotegida que possui.

Seu arquétipo psicológico, portanto, se aproxima e muito da imagem que se tem de um rio, das águas que são seu elemento: uma superfície geralmente plana e tranquila, convidativa e amistosa, mas que pode esconder correntes fortes, redemoinhos difíceis de dominar e grotas profundas e inesperadas.

A um ditado que diz (traiçoeiro como um rio). Não a nada especificamente traiçoeiro em Oxum, mas seus filhos trazem a marca de serem diplomáticos cuidadosos e não necessariamente sinceros, não quando a sinceridade puder trazer uma discussão que se revela evitável.

Os filhos de Oxum preferem contornar habilmente um obstáculo do que enfrentá-lo de frente, ao contrário do que fariam os filhos de Iansã e Obá. Sua atitude novamente lembra o movimento do rio, quando água contorna uma pedra muito grande que está em seu leito, em vez de chocar-se violentamente contra ela.

São muito persistentes no que buscam, tendo objetivos fortemente delineados. Mas as vezes pode parecer que os filhos de Oxum até esqueceram-se de uma questão que antes era importante, não se importando mais com o rumo dos acontecimentos referentes ao tema. Na realidade, Oxum estará agindo por outro caminho, utilizando outras estratégias.

Para essa imagem doce que esconde uma determinação forte colabora a tendência que os filhos de Oxum têm para engordar, não chegando necessariamente a uma forte obesidade, mas, sem duvida, deixando-os com a imagem de seres roliços, sem ângulos fortes ou secos. A imagem do gordinho risonho e bem-humorado sem dúvida tem algum parentesco com o arquétipo ligado a Oxum, ainda mis que seus filhos gostam da vida social, das festas e dos prazeres em geral. Seu tom eternamente amigo e acessível acrescente e reforça essa tendência.

O sexo é importante para Oxum, como qualquer outro prazer. Portanto, seus filhos tendem a possuir uma ida sexual intensa e significativa, mas diferentes das filhas de Iansã. Enquanto estas se revelam totalmente na sua sensualidade, os filhos de Oxum são mais discretos, pois, assim como apreciam o destaque social, também temem os escândalos e qualquer coisa que possa denegrir a imagem de inofensivos bondosos que possuem. Os “casos”, quando existem, são secretos e desprovidos de violência, já que Oxum gosta de relações gentis e suaves.

Faz parte do tipo uma certa preguiça coquete, uma ironia persistente porém discreta e na aparência inconsequente. Verger define assim o tipo “O arquétipo de Oxum é o das mulheres graciosas e elegantes, com paixão pelas joias, perfumes e vestimentas caras, das mulheres que são símbolos do charme e da beleza, voluptuosas e sensuais, porém mais reservadas que Iansã, elas evita chocar a opinião pública, á qual dão grande importância, sob sua aparência graciosa e sedutora, esconde uma vontade muito forte e um grande desejo de ascensão social”. É sem dúvida, uma imagem rara no universo violento e arrebatado dos orixás.

É um arquétipo atemporal, pois, apesar de no candomblé existirem diversas Oxuns (variam de idade de acordo com a profundidade do rio no local e que habitam), a figura da deus tanto é maternal coo passa pelas manias de uma velha, e também possui uma juventude eterna, com seu jeito de criança inconsequente, que julga naturalmente merecer todos os cuidados e mimos.

Este é outro traço marcante dos filhos de Oxum: o tempo passa mais lentamente por eles. Mesmo quando fisicamente já dão sinais da idade, ainda existe dentro deles uma adolescente voluntariosa e jovial, que nunca desaparece, escondendo sempre, através da superfície serena do rio, as águas profundas e misteriosas que ninguém realmente conhece, a não ser que mergulhe nelas…

Nos xangôs do Nordeste, também é cultuada como Oloxum.

Nome: Oxum
Filiação: Yemanjá e Oxalá
Elemento: água doce
Domínio: beleza (estética) e ouro (dinheiro) atuam também sobre a maternidade
Cores: amarelo-ouro (na umbanda, branco e azul).
Saudação: Aiieieô, ou Eri ieiê ô, ou Ora Ieiê ô.
Comidas: omolocum (feijão-fradinho, cebola e camarão), xinxim de galinha.
Sacrifício: cabra, galinha, pata
Dia: sábado
Sincretismo: diversas Nossas Senhoras (de acordo com a região)